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Resenha de livro: Leon Trotski, A paixão segundo a revolução

O livro Leon Trotski, com o subtítulo “A paixão segundo a revolução”, de Paulo Leminski, Editora Brasiliense, 152 páginas, de 1986, é uma das obras mais importante do escritor paranaense.

Nela, Leminski expõe toda a sua cultura e erudição sobre literatura russa, sobre a Revolução Russa e sobre a vida de Leon Trotsky.

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Além disso, há todo um capítulo onde Paulo discute a cultura, sendo muito atual neste momento em razão das trevas em que vivemos, do “terraplanismo” olvavista/bolsonarista.

Interessante é que Leminski faz uma análise sobre o estalinismo mais concreta, abordando a trajetória de Josef Stalin, sem o tendencionismo, por exemplo, de um Charles Malamuth, que deturpou a tradução do biografia de Stalin, escrita por Trotsky, trabalho que veio a ser um último do Velho Leão, que chegou a ser assassinado sem concluí-lo. Agora há uma nova tradução feita pela Editora Marxista e a Editora Movimento, em dois volumes, de 2017, de Caio Dezorzi, com colaboração de Felipe Libório e Fabiano Leite.

Leminski não nega a trajetória política de Stalin, o qual foi um antigo revolucionário bolchevique e junto com Trotsky, foi o segundo comandante político do Exército Vermelho (além dos comandantes políticos, o Exército Vermelho tinha os comandantes em chefe militares, como Vasetis, apoiado por Trotsky, e depois, Kamenev - general, nada a ver com o homônimo cunhado de Trotsky, casado com sua irmã Olga, Lev Kamanev, velho bolchevique que fez parte da famosa troika, Stalin, Kamenev e Zinoviev -, apoiado por Stalin). Inclusive, Stalin tinha bolcheviques de alto nível, como Frunze, entre os seus aliados políticos (Frunze veio a falecer logo após a Guerra Civil), como demonstrou, por exemplo, o historiador britânico Robert Service, na sua biografia de Trotsky.

Todavia, Leminski, às vezes, repete algumas coisas muito exploradas pelos revisionistas do trotskismo, sobre os supostos erros de Trotsky, como no caso da Fortaleza de Kronstadt, na Guerra Civil de 1921, quando os marinheiros se revoltaram contra o poder soviético e seu motim teve de ser esmagado, porque com aproximação do final do inverno e o consequente descongelamento do golfo da Finlândia, a 30 kilomentros do ocidente de Petrogrado, havia um risco enorme da Fortaleza ser tomada pelas forças da contrarrevolução. Houve tolerância até o último momento, mas chegou uma hora que era necessária a intervenção. Aí Felix Dzerzhinsky e Trotsky lideraram a retomada de Kronstadt.

Pondere-se, ainda, que os heroicos marinheiros de Kronstadt tinham sido mobilizados anteriormente para as frentes de batalha da Guerra Civil de 1918/1921 e a maioria havia morrido. Os marinheiros amotinados eram jovens e inexperientes, sem tradição de luta revolucionária, como os antigos e heroicos, que lutaram e morreram na Guerra Civil.

Não que Trotsky não tenha cometido erros. Trotsky era humano e com certeza cometeu muitos erros. Devido a influência católica, e mesmo evangélica, no Brasil, o trotskismo revisionista brasileiro, ao invés de fazer uma análise concreta da situação concreta, como nos ensinou Lênin, ou seja, uma análise marxista, materialista histórica e dialética, ao contrário, o revisionismo faz um análise idealista, religiosa, baseada na dicotomia “do bem” e  “do mal”, buscando encontrar os santos redentores, salvadores e libertadores, assim como apontar os pecadores. Talvez isso influenciou também Leminski.

Mas o mais importante de tudo é que o livro de Leminski é uma biografia resumida de Trotsky e uma introdução maravilhosa à literatura russa de suma importância:

“A literatura russa, que atinge, nesse período, uma verdadeira idade do ouro, reflete fielmente esse conflito, nas obras de um Gógol, um Tolstói, um Turguiênev, um Tchekov, sobretudo Dostoiévski.” (pág. 24).

“Artisticamente, os anos 20, o período da NEP, foram  a Idade do Ouro da arte soviética. Jamais se vira tamanha explosão de talento criador. Para ilustrá-lo, bastam os nomes de Eisenstein, Djiga-Viértov e Pudóvkin, no cinema, Staniláviski e Meyerhold, no teatro, Maiakóvski, Khiélbnikov e Iessiênin, na poesia, Isaac Bábel e Bóris Pilniak, na ficção, Kandinski, Maliévitch, Chagal, Larionov, Tátlin, El Lissítzki, nas artes visuais.

Todos eles tiveram seu apogeu criativo criativo nos anos 20, sob o impulso da Revolução. Quase todos apoiaram, a seu modo, a implantação do comunismo e o nascimento de uma nova sociedade (o caso Maiakóvski é, quase, exemplar). Muitos seriam depois vítimas do brutal obscurantismo da era stalinista (Bábel, Meyerhold, Pilniak).

Mas não seria correto apresentá-los, como se faz, como modelos de uma arte soviética, a arte criada pelo socialismo. Todos os artistas, entre os maiores do século XX, nasceram e se desenvolveram no período czarista. Seus vanguardismos e futurismos não são bem vistos na URSS até hoje. Eles mexeram demais com as formas. Ora, como via Lukács, corretamente, “o social, na arte, é a forma”. Quem mexe na forma, mexe no que não lhe pertence (Adorno, um pensador marxista, viu melhor: “a arte é anti-social”).

Foi nos anos 30 que arte russa foi socializada, domesticada de acordo com determinações superiores: dessa década em diante, o artista soviético é um operário como os outros, sujeito a diretrizes político-partidárias, alvo da mais grave das censuras, a censura formal (é proibido inovar).” (págs. 86/87).

Além disso, a obra é uma viagem, ainda que curta, pela Revolução Russa, pela obra de John Reed, o jornalista comunista norte-americano, enterrado no Kremlin, que cobriu a Revolução e escreveu “Os dez dias que abalaram o mundo”, bem como pela “História da Revolução Russa”, "Lições de Outubro",  de Trotsky.

Assim, “Leon Trotski”, “A paixão segundo a revolução”, de Paulo Leminski, é uma obra de enorme importância da literatura brasileira que recomendamos, ainda mais neste período em que vivemos constantes ataques à cultura. Portanto, o seu resgate é uma forma de luta contra o obscurantismo da burguesia nacional e do imperialismo decadentes.

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