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A Revolução Permanente na América Latina

A Tendência Marxista-Leninista publica abaixo a comunicação apresentada pelo camarada João Neto, no Evento virtual Trótski em Permanência, em homenagem aos 81 anos da morte do revolucionário soviético.

A comunicação em questão era para ter sido apresentada no dia 4 de agosto, mas por problemas técnicos o camarada não pode apresentá-la, sendo que a organização do Evento facultou ao camarada que enviasse uma comunicação gravada.

O tempo regulamentar para a apresentação da comunicação era de 15 minutos, fazendo com que a apresentação fosse de apenas um resumo, todavia, nesta oportunidade, o camarada aprofundou mais o tema.

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A Revolução Permanente na América Latina é um tema muito abrangente. Neste estudo, abordaremos as experiência mais significativas, mais importantes.

Inicialmente, vamos recapitular algumas teses da Teoria da Revolução Permanente, enunciada por Karl Marx e desenvolvida por Leon Trotsky, relativas aos países atrasados, semicoloniais, como os latino-americanos:

“1. A teoria da revolução permanente exige, na atualidade, a maior atenção da parte de todo marxista, uma vez que o desenvolvimento da luta ideológica e da luta de classes fe o problema sair definitivamente do domínio das recordações das velhas divergências entre os marxistas russos, para apresenta-lo em ligação com o caráter, os laços internos e os métodos da revolução permanente internacional em geral.

2. Para os países de desenvolvimento burguês retardatário e, em particular, para os países coloniais e semicoloniais, a teoria da revolução permanente significa que a solução verdadeira e completa de suas tarefas democráticas e nacional-libertadora só é concebível por meio da ditadura do proletariado, que assume a direção da nação oprimida e, antes de tudo, de suas massas componesas.

3. Tanto a questão agrária quanto a questão nacional conferem ao campesinato, como enorme maioria da população dos países atrasados, um papel primordial na revolução democrática. Sem a aliança entre o proletariado e o campesinato, as tarefas da revolução democrática não podem ser resolvidas, nem mesmo ser colocadas a sério. Essa aliança das duas classes, porém, só se realizara numa luta implacável contra a influência da burguesia nacional-liberal.”  (Leon Trotsky, “A REVOLUÇÃO PERMANENTE”, pág. 205/206, Editora Expressão Popular, São Paulo, 2007).

Cabe uma observação com relação ao campesinato pobre, o qual vem se transformando em trabalhador rural, com o desenvolvimento dos países atrasados, sobretudo países mais industrializados, como a Argentina e o Brasil, isto é, com o processo de urbanização, que implica na redução da população rural.

A Revolução Permanente na América Latina está marcada pela política de frentes populares, ou seja, frente populistas de conciliação e colaboração de classes, a política de subordinar a luta dos trabalhadores aos interesses da burguesia, portanto uma política eminentemente menchevique.

Inicialmente, tivemos a experiência do APRA (Aliança Popular Revolucionária Americana), de Víctor Raúl Haya de la Torre, a partir de 1929.

Tivemos a experiência na Argentina, com o morenismo subordinando-se ao nacionalismo burguês do General Perón, ao defender a palavra de ordem “sob a disciplina do General Perón”.

No Brasil, tivemos primeiro a experiência do Partido Comunista Brasileiro, o PCB, que depois do período ultra-esquerdista do terceiro período da Internacional Comunista (quando houve a “Intentona Comunista”, em 1935), deu uma guinada para a política frente populista, em conformidade com a virada da IC, adotando a política de seu teórico, Gergi Dimitrov.

Ainda em nosso País, tivemos as experiências do PT (Partido dos Trabalhadores), primeiro com Lula e José de Alencar, a partir de 2002, e depois com Dilma e Temer, a partir de  2010 até 2016, quando ocorreu o golpe que derrubou Dilma Rousseff.

Na Bolívia, em 1952, ocorreu a Revolução Boliviana, que destruiu o exército e o Estado burguês, mas infelizmente a classe operária, com a sua vanguarda revolucionária, os mineiros, não lograram tomar o poder em razão da política frente populista da direção do Partido Obrero Revolucionário da Bolívia (o POR boliviano), que apoiou a ala esquerda do Movimento Nacionalista de Revolucionário (MNR), de Paz Estenssoro e Siles Zuazo, subordinando a política dos trabalhadores aos interesses da burguesia, o que permitiu que a revolução fosse golpeada e o Estado burguês reconstruído.

Essa política do POR boliviano foi eminentemente menchevique. O POR estava dividido, mas todas as tendências do mesmo e da IV Internacional apoiaram a ala esquerda do MNR.

A IV Internacional a partir dessa derrota na Bolívia deixou de existir enquanto partido mundial da revolução proletária. Com isso não negamos a luta dos trotskistas após 1952, mas ela, enquanto Internacional deixou de existir.

Depois, ainda na Bolívia, em 1971, tivemos a experiência da Assembleia Popular, o primeiro soviete da América Latina (Conselhos Operários, com funções deliberativas e executivas, órgãos de duplo poder, ou seja, órgão que visam a tomada do poder). Todavia, mais uma vez o POR boliviano, com a sua política frente populista e menchevique, agora apoiando o governo nacionalista do General Torres, com ilusão grave de que este fosse entregar armas aos trabalhadores, conforme a desorientação de seu principal líder, Guillermo Lora. Essa política do POR foi denunciada pela fração Vern-Rayan da Califórnia, do Socialist Works Party (SWP).

O POR defende a Frente Revolucionária Anti-imperialista (FRA). Essa política vem do IV Congresso da Internacional Comunista, de acordo com as Teses Gerais do Oriente, elaboradas por Gerg Zinoviev. Tais teses são eminentemente etapistas e mencheviques. Basta dar um lida nas mesmas e constata-se facilmente o seu caráter burguês. Possivelmente, elas foram aprovadas no IV Congresso da Internacional Comunista, talvez por pressão dos movimentos de libertação nacional da época, mas elas afrontam a Teoria da Revolução Permanente.

Cuba: a experiência vitoriosa

A única exceção na América Latina, foi a Revolução Cubana, onde inicialmente, embora fosse adotada a política de frente populista, houve posteriormente uma ruptura com a mesma, com o proletariado cubano e a maioria oprimida nacional indo além do programa pequeno-burguês da direção castrista e expropriando a burguesia, ou seja, apoderando-se dos meios de produção.

Essa hipótese foi prevista por Trotsky, no Programa de Transição:

“É possível a criação de um governo dessa espécie pelas organizações operárias tradicionais? A experiência pregressa mostra-nos, como já foi dito, queé, para dizer-se o mínimo, altamente improvável. Não podemos, no entanto, negar categoricamente de antemão a possibilidade teórica de que, sob a influência de circunstâncias completamente excepcionais (guerra, derrota, crash financeiro, pressão revolucionária das massas, etc.), o partidos pequeno-burgueses, inclusive os stalinistas, possam ir além do que desejem na via da ruptura com a burguesia. Em todo caso, uma coisa está fora de dúvida: mesmo que essa variante altamente improvável se tornasse, em algum lugar e em algum momento, uma realidade e o “governo operário e camponês”, no sentido mencionado acima fosse estabelecido de fato, isso representaria meramente um curto episódio na via da verdadeira ditadura do proletariado.” (Leon Trotsky, Programa de Transição, págs. 58/59, Tradução e notas de Rui Costa Pimenta, Edições Causa Operária, Outubro de 2019).

Logo após a insurreição, Fidel Castro em Nova Yorque, fez um discurso onde disse que a Revolução era obra de todas as classes. Todavia, isso não era verdade, pois embora setores da burguesia participasse da frente popular (como sempre esperando uma oportunidade para golpear a revolução e promover a contrarrevolução), concretamente quem impulsionava Revolução era o Movimento 26 de Julho, o Partido Comunista Cubano e o movimento operário e popular com os camponeses pobres radicalizados, que promoveram greves gerais e lançaram uma ofensiva, fazendo com que fosse realizada a Reforma e Revolução Agrária, o que desembocou na expropriação da burguesia e na expulsão do imperialismo.

Colômbia e Nicarágua: as experiências que ficaram no meio do caminho

Na Colômbia, há mais de 60 anos, existe um movimento guerrilheiro que chegou a dominar boa parte do território colombiano, todavia não chegou a tomar o poder. As Forças Armadas Revolucionárias (Farcs) e Exército de Libertação Nacional (ELN) travam uma luta heroica, mas infelizmente, em razão da limitação de seu programa foquista pequeno-burguês, não consegue adotar uma estratégia revolucionária, que propicie a tomada do poder na Colômbia. Apenas o programa operário marxista revolucionário poderá traçar a tática e estratégia da revolução proletária na Colômbia, apontando as limitações da “teoria do foquismo”, uma vez que não basta “atuação heroica, exemplar e individual”, mas ter a perspectiva que a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores, como ensinou Karl Marx.

A experiência de Che Guevara na Bolívia, em 1967, demonstrou a limitação do foquismo, isto é, a guerrilha isolada do movimento de massas não propicia perspectiva para os trabalhadores. A guerrilha é um método de luta, como a guerra civil, as mobilizações, as greves, os protestos, podendo ser adotada em conformidade com a situação política concreta, como, por exemplo, fizeram os guerrilheiros iugoslavos. Ela não pode ser erigida a uma panaceia. Outra coisa, a guerrilha colombiana deve rechaçar os “acordos de paz” do governo colombiano, pois o objetivo dele é apenas implementar uma caçada, visando o extermínio físico dos guerrilheiros. As Farcs  e o ELN colombianos necessitam fazer esse balanço para mudar sua estratégia de luta, adotando o marxismo revolucionário para sua inserção no movimento de massas colombiano.

Em 1979, houve a experiência da Revolução Nicaraguense, todavia a direção guerrilheira da frente sandinista, liderada por Daniel Ortega, praticamente entregou o poder à burguesia, com um governo de coalizão com os empresários, liderados por Alfonso Robelo Callejas.

A nova estratégia do imperialismo: “capturar” movimentos populares legítimos

A partir da Revolução Nicaraguense, em 1979, o imperialismo passou a adotar uma política mais “sofisticada” de contrarrevolução, mudando seus métodos de atuação. Antigamente, o imperialismo agia de forma direta, como fez, apenas para exemplificar, no Brasil em 1954/1964, Bolívia em 1971, no Chile em 1973, na Argentina em 1976, etc. Agora, o imperialismo além de se infiltrar e atuar diretamente, também impulsiona movimentos populares, implementando a sua estratégia, como fez, por exemplo, no Brasil, em 2016, na derrubada de Dilma Rousseff.

Isso aconteceu também, por exemplo, na Polônia, em 1990, quando o imperialismo apoiou, numa santa aliança com o papa, o movimento do Sindicato Solidariedade, dirigido pelo sindicalista católico, Lech Walenza, ocorreu ainda quando o imperialismo, em 1991, apoiou o governo de Boris Ieltsen, com a restauração capitalista na ex-URSS, na derrubada de Muamar Kadafi, na Líbia, em 2011, etc...

Para tanto, o imperialismo, desde a Sociedade das Nações (que Lênin chamou de covil de bandidos), impulsionou e desenvolveu a ONU (Organização das Nações Unidas), a OTAN (Organização do Atlântico Norte), seu braço armado, a CIA, a Central de Inteligência norte-americana, o Departamento de Estado, que é o ministério das relações exteriores ianque, a União Europeia, etc...

Infelizmente, enquanto o imperialismo a cada dia se organiza ainda mais, por outro lado os trabalhadores se ressentem da falta de uma Internacional comunista, operária e revolucionária, cuja construção a nossa tendência defende como fundamental para a revolução proletária mundial.

 As perspectivas da Revolução Permanente nos dias de hoje

A classe trabalhadora latino-americana trava hoje uma batalha de suma importância em Cuba, sendo fundamental a sua defesa incondicional do Estado operário cubano.

Isso não significa apoio à burocracia restauracionista. Aqui fazemos uma analogia da luta dos bolcheviques, com Lênin e Trotsky, contra o golpe do General Kornilov para derrubar o governo de Kerensky. Lênin, em acarta ao comitê central do partido bolchevique, esclareceu que: 

“chegar a formar um bloco com os socialistas revolucionários, sustentar o governo provisório, supõe o erro mais crasso ao mesmo tempo em que dá prova de uma falta absoluta de princípios. Não nos converteremos em defensores ‘até depois’ da tomada do poder pelo proletariado. (…) Sequer agora devemos apoiar o governo de Kerensky. Seria faltar com os princípios. Alguém fará uma objeção: não será preciso combater Kornilov? Claro que sim; mas entre combater Kornilov e apoiar Kerensky existe um limite...".

Ou seja, como diziam Lênin e Trotsky, na luta contra o golpe do general Kornilov, eles jamais apoiaram o governo Kerensky, "nem por um instante".

A Ilha, após mais de 60 anos de bloqueio norte-americano, encontra-se em uma situação política e econômica dramática, evidenciando o absurdo da “Teoria do Socialismo em um só país”.

No mês passado, houve manifestações e protestos legítimos da população, em razão das difíceis condições de vida, provocadas pelo bloqueio imperialista, combinadas com a política de restauração capitalista da burocracia. Todavia, o imperialismo e os gusanos desde Miami imediatamente aproveitaram para tentar "capturar" o movimento, lançando a reacionária palavra de ordem "Pátria y Vida" (como nos ensinou Karl Marx, os trabalhadores não têm pátria, a classe operária é internacional), com o objetivo de impulsionar a restauração do capitalismo em Cuba.

Stalin derrubado pelos trabalhadores: é um grande passo para o socialismo. Stalin eliminado pelos imperialistas: é a contra-revolução que triunfa. Tal é o sentido preciso de nossa defesa da URSS em escala mundial, trata-se de uma orientação análoga de nossa defesa da democracia em escala nacional.” (Leon Trotsky, Uma Vez Mais: A União Soviética e Sua Defesa4 de Novembro de 1937).

Cuba necessita de uma revolução política para que a burocracia seja substituída pela classe trabalhadora. Todavia, é importante assinalar que para a burocracia ser substituída não é suficiente a classe em si, mas a classe para si, ou seja, a expressão consciente da classe trabalhadora cubana, através de seu partido operário marxista revolucionário, seção da Internacional comunista, operária e revolucionária.

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