A Tendência Marxista-Leninista apresenta nesta oportunidade um estudo inicial sobre o golpe contra o presidente Getúlio Vargas, 1954, em que as massas esmagaram aos golpistas.
O Estudo foi baseado na obra “História Sincera da República, de 1930 a 1960” (esta obra foi escrita em 4 volumes), da Editora Alfa-Omega, 4ª Edição, São Paulo, 1976, de Leôncio Basbaum, médico e dirigente do Partido Comunista Brasileiro (PCB), nascido em Recife a 6 de novembro de 1907 e falecido em São Paulo, em 1969, “logo após terminar a redação do seu livro de memórias.”
Leôncio militou por 40 anos, tendo escrito várias obras, dentre elas, A Caminho da Revolução, (Pseudônimo: Augusto Machado), 1934, Editora Calvino, RJ; Caminhos Brasileiros para o Desenvolvimento, 1960, Editora Fulgor, SP; e a autobiográfica Uma Vida em Seis Tempos (memórias), 1ª Edição, 1976, Editora Alfa-Omega, SP.
Este Estudo também é uma homenagem a Leôncio, que morreu em março de 1969, há 47 anos, cujas obras foram muito apreciadas pela juventude, sobretudo estudantes que saíram às ruas, em 1977, contra a ditadura militar.
A experiência de golpe no Brasil é rica. Em 1954, deu errado com Getúlio Vargas. Mas os golpistas não desistiram, forçaram a renúncia de Jânio em 1961. Depois, para que João Goulart não assumisse, inventaram a Emenda parlamentarista (a ideia é retirar o poder do presidente da República), com Tancredo Neves como primeiro ministro (olha o vovô aí!). De golpe essa família entende!
Depois, em 1964, houve o golpe militar, seguido do AI-5, em 1968, considerado o golpe dentro do golpe. É mole ou quer mais!
Rui Costa Pimenta, dirigente do Partido da Causa Operária (PCO), nas Plenárias semanais, onde analisa a conjuntura política, sempre menciona que parece que abrem um armário e saem os mesmos personagens e atores de sempre da vida política nacional, como se fosse um filme de terror.
O camarada Rui tem razão. O filme é velho.
Os personagens somente mudam de nome. Por exemplo, União Democrática Nacional (UDN) para Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB).
Já os temas são os mesmos: corrupção, privatização da Petrobrás, bancos, ingerência norte-americana, renúncia, ataque aos direitos trabalhistas, etc.
O golpe de 1954 contra Getúlio
Getúlio Vargas volta ao poder em 1951.
“Os três anos e meio que Getúlio conseguiu governar foram os mais agitados da vida constitucional do país. O ex-ditador, de volta ao poder, decidira reiniciar sua política de “aproximação com as massas”, interrompida em 1945.(...).” (pág. 203).
Para executar essa política resolvera entregar o Ministério do Trabalho a um novo personagem, o jovem João Goulart, cuja atividade iria chamar sobre si a atenção dos grupos mais reacionários do país. João Goulart – popularmente conhecido como Jango - iniciou suas atividades, ligando-se aos líderes sindicais e aos chamados “meios trabalhsitas”, aos quais começou a atrair para o seu Partido em apoio à política de Getúlio.(...).
Uma de sua primeiras medidas foi a fixação do salário mínimo. (...)” (pág. 203).
Pouco depois, resistindo a todas as pressões e ameaças do embaixador americano e seu governo, mas obedecendo ao que chegou a ser pelo vigor da campanha, um clamor popular, aprovava o Congresso a Lei n. 2004 que criou a Petrobrás. Se o salário mínimo era um golpe contra a UDN, a Petrobrás fora um golpe muito maior, contra os Estados Unidos. E ambos mais uma vez se uniram, para mais uma vez derrubar Getúlio. (...) (pág. 204).
Contribuíram ainda para aumentar a onda da reação e dos grupos imperialistas contra o governo de Vargas as relações amistosas que vinha mantendo com Peron, o Presidente argentino, então em luta contra o governo americano. Finalmente, pouco depois de sua posse, fizera uma grave denúncia à nação acusando o governo anterior de haver facilitado a remessa de lucros das empresas americanas, para além do limite de 8% fixado em lei, com grandes prejuízos para o país.
Todos esses fatos que, isoladamente, teriam significação menor, reunidos, passaram a configurar a posição do governo como uma oposição clara e ostensiva contra “os nossos tradicionais amigos norte-americanos”. (...) (pág. 204).
“A UDN contava com os mesmos grupos econômicos ligados à grande burguesia industrial e ao capital financeiro, cada vez mais forte pela concentração dos bancos (1), associados aos “trusts” americanos que desde 1951 e sobretudo a partir de 1954, em virtude da famosa instrução 113, começavam a ingressar no país, agressivamente. (...).” (pág 214).
A UDN contava ainda com parte das classes médias urbanas descontentes, empobrecidas, eternamente sacrificadas, os anti-getulistas, os oposicionistas, os eternos herdeiros dos “ideais de 30”, jamais definidos e por isso mesmo jamais realizados, e grande parte dos intelectuais. Prometia, como essência do seu programa, a luta contra a corrupção, e, obviamente, a entrega do petróleo ao capital privado, ou seja, aos americanos. Exigiam a não-ingerência do Estado nas empresas e nos negócios em geral, defendiam a iniciativa privada e a “amizade eterna com os Estados Unidos”, em cuja órbita, segundo o expoente máximo do udenismo, Raul Fernandes, “devemos gravitar”. (pág. 214).
É sempre bom lembrar, no que tange à corrupção, que ela é inerente ao regime capitalista, onde vigora a Lei de Gerson (jogador de futebol da Seleção brasileira, que fazia a propaganda de cigarros, com o bordão de que “gosto de levar vantagem em tudo”), o chamado lucro, a lei do valor, a extração da mais-valia, da exploração do homem pelo homem. O regime capitalista, com a fusão do capital bancário com o industrial, formando o capital financeiro, entrou em sua fase de decadência imperialista, com os monopólios e o acirramento das disputas interimperialistas por mercados, época de reação em toda linha, guerras e revoluções. As crises do capitalismo atualmente são cada vez mais profundas, são crises de superprodução, porque hoje há produtos suficientes para satisfazer as necessidades de toda a humanidade. Não se justifica que os meios de produção continuem propriedade de apenas 1% da humanidade e que haja tanta concentração de riqueza.
As massas se lançaram à rua dispostas a lavar sangue com sangue
“(...) Pela madrugada do dia seguinte, 24 de agosto, decide aceitar a fórmula do “licenciamento”. Retira-se para os seus aposentos particulares e, poucas horas depois, às 8 manhã, suicida-se com um tiro no peito.
O suicídio, mais do que a renúncia, abalou a nação, pelo seu dramatismo. E o que parecia ter sido simples golpe branco, que pouco impressionaria o povo, que já esperava a renúncia e se conformava com ela, transformou-se num crime cometido contra a nação e contra o povo. Este, revoltado, e já agora tomado de uma decisão, chegou a ameaçar de depredação o edifício do Ministério da Aeronáutica. Houve mesmo ataque a tropas. No Rio (era a capital federal na época – Nota de IR), comércio e fábricas fecharam as portas, jornais anti-getulistas foram depredados. As massas se lançaram à rua, desesperadas e indignadas, dispostas a lavar sangue com sangue. Alguns dos principais instigadores da renúncia e do suicídio, entre os quais o jornalista Carlos Lacerda, acharam melhor desaparecer algum tempo para fugir à ira popular. O mesmo estava acontecendo em outras cidades, principalmente São Paulo e Porto Alegre.
As agitações mais se aguçavam quando no dia seguinte o povo tomou conhecimento da carta deixada pelo presidente suicida: uma carta impressionante pelas acusações diretas que fazia aos seus inimigos e às “forças ocultas do estrangeiro” que sobre ele não cansavam de pressionar.
E o que parecia ser uma vitória da UDN se transformara em derrota. A UDN subia ao poder, de cabeça baixa, de ombros curvados, ao peso de um cadáver.” (pág. 209).
A carta-testamento despertara no povo sentimentos nacionalistas e anti-americanos adormecidos pelos problemas imediatos da inflação e do alto custo de vida. Daí por diante o nacionalismo se transforma na bandeira de luta que passa a definir e a dividir os dois grupos em choque: de um lado os nacionalistas, que se opõem ao imperialismo e à entrega do petróleo aos americanos e de outros "entreguistas". E a palavra nacionalismo, para esse grupo, passa a ser subversiva. Os udenistas e golpistas, que haviam participado do complot, já não eram apenas assassinos, mas "entreguistas", vendedores da pátria. (pág. 211).
A carta-testamento despertara no povo sentimentos nacionalistas e anti-americanos adormecidos pelos problemas imediatos da inflação e do alto custo de vida. Daí por diante o nacionalismo se transforma na bandeira de luta que passa a definir e a dividir os dois grupos em choque: de um lado os nacionalistas, que se opõem ao imperialismo e à entrega do petróleo aos americanos e de outros "entreguistas". E a palavra nacionalismo, para esse grupo, passa a ser subversiva. Os udenistas e golpistas, que haviam participado do complot, já não eram apenas assassinos, mas "entreguistas", vendedores da pátria. (pág. 211).
Para terminar, apenas uma observação quanto aos atores: na época não havia PT, PCO, CUT, CTB, MST, MTST e os diversos movimentos populares e sociais, e mesmo assim o povo se lançou às ruas disposto a lavar sangue com sangue.
Ignácio Reis
1 Ver, de Leoncio Basbaum, Caminhos Brasileiros do Desenvolvimento, Ed. Fulgor, São Paulo, 1960, pág. 83.
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